Carrego uma bala alojada na espinha como amuleto. As vértebras, cravejadas de ironia, às vezes cambaleiam num balé esquisito. Os vasos engalfinhados formam as nervuras do sangue que jorra intrépido e descoagulado. Entre abalos e afagos me divirto.
Os cabelos em corte moicano ou rebelados revelam os tufos desalinhados embaixo de um turbante negro. As madeixas em mechas desaprumadas insistem em esvoaçar sob as carícias e o toque dos teus dedos. Olhos caídos, às vezes murchos, desfigurados. Outras vezes, ambíguos, amplos e misteriosos. Combinam expressão, sedução e profecias.
As estrias, corredeiras do mal anunciado, cicatrizes inevitáveis das rosas a desabrochar. As pétalas podem sofrer a dor do encanto esvaído. Ainda resiste o caule que continuará brotando e atento ao corpo renovado. As células pulsam e fervem na dança do renascimento.
Nos ombros, transportamos a carga e as fivelas pressionadas pelo destino. As excentricidades em forma de manias, compulsões, caprichos ou obsessões são as digitais originais da identidade. O peso opressivo da memória contrasta com os horizontes da fachada das nossas disparidades excêntricas.
O coração assustado pelo repique estridente dos alvoroços, navalhado pelos golpes exatos do tempo. Ressoam à volta os açoites retumbantes e escandalosos de uma sirene espalhafatosa. Os baques de um corpo que ameaça cair em destroço são abafados pela maciez da compostura, pelo vento que sopra a brisa do silêncio.
No matagal infestado de incertezas, um comboio de luzes aflitas controla a direção e os sentidos (inclusive os contrários). Marcham absortos os tripulantes em direção ao cais. Lanças pontiagudas e contundentes empatam a travessia. A embarcação de papel estremece na colisão das cores anêmicas do possível naufrágio.
No limiar do castelo de cartas marcadas, uma barricada de troncos, pedras, cimento e uma única sentinela que vela por todos os excêntricos.