Aprendi a me convencer que além das tuas curvas existiam outras fendas menos secretas. Mesmo sem querer conheci o sabor de outras bocas, a hospitalidade de outras pousadas. Compreendi que a infidelidade é apenas uma possibilidade que se manifesta casualmente, pontualmente nos pontos mais frágeis dos homens. A fidelidade que julgava apenas como um dogma religioso, foi infiel. Fui traído. Diferem-se as relações maduras das amadoras as que conseguem administrar as rachaduras. Defendi honestamente a habilidade de desmistificar o código do seu corpo. Todos os toques foram sentidos, consentidos, divididos. Da tua boca sufocada pela ausência de ar, soprei sílabas de desejos e hálito de pecados. Assumo minha postura de anjo e demônio da mesma forma que deveria acolher os créditos intermitentes de santa e de puta. Subornei o tempo para recompor o ritmo que precisávamos. Tentei domesticar os teus vícios, frutos de uma criação protetora e me tornei prisioneiro (fui conivente). Avancei decidido sobre as tuas inseguranças. A violência da tua severidade violou a minha paciência. Fiz das minhas hesitações o quintal tranquilo do meu repouso em desespero. Tentei compreender as encruzilhadas da tua rota e me perdi entre as rochas que te guardavam. Cruzei o emaranhado complexo das tuas fantasias e fui ridículo ao ceder aos seus caprichos. Submeti o calor latino à frieza escandinava - quase me tornei frustrado por me achar culpado. Do amor definido nos bilhetes e encontros furtivos foi revelado a parcela sofrida da verdade partida. Éramos mais do que supúnhamos. Multifacetados, compostos de muitos. Não soubemos lidar com as múltiplas invasões que intimidaram nosso sono. Bastava a simples compreensão da renúncia necessária para evitar a solidão do vazio.
De um lado a fé no nos milagres, no invisível aos olhos limitados. Em contrapartida o cansaço, o pragmatismo, a razão aos pedaços, o equilíbrio incerto, o curso lento do otimismo, a fragilidade das verdades com sombra de dúvidas. O espanto se dá quando somos compelidos a entender que não somos um só, que além do nosso ego circulam outros projetos. A nossa satisfação está intrinsecamente atrelada a nossa própria realização.
Em oposição ao homem comedido, econômico nos verbos ergue-se o indivíduo que escreve pelos cotovelos, não vê sentido na ativação de filtros de censura. Não se vê ameaçado nas suas poucas reservas. Entrego aos raros amigos as confidências que extrapolam o peso que consigo suportar. Do mesmo modo, sou todo ouvidos.
Emotivo (principalmente com coisas simples), intenso (com tudo que valha a pena). Continuo cometendo enganos e muitas vezes me equivoco com aparências e fingimentos. Frágil com tudo que se refere ao meu filho. Firme quando insultam ou subestimam minha inteligência.
Exerço a indiferença quando necessário, sou frio e calculista por mecanismo de sobrevivência. Por instinto pratico o egoísmo e o desprezo. Desconfio que o ódio não tenha conquistado a minha adesão por decisão. Embora saiba que ele se mantém recostado à porta, esperando por um sinal. Venero com igual entusiasmo idosos e crianças. Ambos possuem a sutileza da vida, o contraste entre nascimento e a eternidade em forma de sabedoria.
Não sou amargo nem alimento recalques pelas ilusões desfeitas. Novos enganos serão cometidos, diferentes práticas serão implantadas, antigas serão resgatadas e sigo assim...
Às vezes mais, às vezes menos... Um eterno contraste.
Às vezes mais, às vezes menos... Um eterno contraste.
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