Com frequência, bruscamente sou assustado pela imagem nítida da minha infância, onde lembranças vivas ainda resistem ao tempo por cerca de 30 anos.
Todos os dias meu irmão e eu saíamos em disparada para o colégio. Atrasados, desatávamos o barulho inevitável da nossa pressa saudável nas escadarias do terceiro andar do prédio onde morávamos.
Senhoras recalcadas, hipócritas, falsas moralistas reclamavam das nossas peripécias. O barulho de crianças demoníacas (segundo elas), afrontava suas pressupostas prerrogativas à salvação. A nossa alegria causava-lhes desconforto. Nas noites de domingo, vestidas de longas saias escondendo as pernas brancas, sem graça, improváveis de desejos. Mascaravam-se sob véus escuros, a obscuridade mental das suas maldosas fofocas. Sempre ouvíamos indignados, os gritos desesperados de uma criança sendo castigada.
De volta do colégio, atentos a qualquer detalhe que pudessem ser usados como matéria para nossas aventuras, tropeçamos em dezenas de folhas rasgadas de revistas pornográficas. Maliciosamente, entreolhamo-nos e com sorrisos irônicos, em sincronicidade pensamos nas beatas. Escolhemos minuciosamente as poses mais escancaradas e sem o menor constrangimento avançamos nossa molecagem. Em cada porta, depositamos estrategicamente recortes da suruba. Ficamos imaginando as caras atônitas das puritanas. Quem sabe tenham usado as figuras indecentes como inspirações para os seus discursos duvidosos.
Vingados, às gargalhadas seguimos para a próxima traquinagem.
Irmão, você partiu cedo demais. Às vezes me flagro rindo sozinho e olho para o vazio tentando enxergar teu sorriso sarcástico. Tomara que possa me visitar vez em quando...
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